18
de Fevereiro de 2012
Enquanto os escritores dão continuidade ao
Benzerinagui, o salão começa a encolher. As paredes começam a aproximar-se
muito lentamente. O tempo para decidir o vencedor desta última mesa vai-se
esgotando. Nela todos se mantêm em grande efervescência criativa.
Sem vencedor declarado e com oito jogadores em
disputa, os leitores das histórias dão a entender que o grande vencedor deste
Benzerinagui poderá estar sentado nesta mesa. Uma improvável conjugação de
factores colocou os mais criativos e aguerridos de todos os jogadores na mesma
mesa de jogo. As histórias que criam amontoam-se em milhares de folhas até ao
tecto, folhas onde se descrevem as mais fascinantes personagens que depois se
envolvem nas mais complexas e brilhantes relações através de paisagens nunca
antes reveladas. Este espectáculo grandioso criado à sua volta mantém estes
extraordinários escritores tão compenetrados na sua arte que nenhum deles se
apercebeu do movimento das paredes.
Em cada uma das holoesferas espalhadas pelos mais
recônditos locais do universo acendeu-se, intermitente, a luz vermelha das
escolhas. Para os espectadores leitores o tempo das decisões está perto do fim.
Se não decidirem rapidamente, se ficarem reféns das histórias que acompanham,
as paredes alcançarão os oito jogadores, destruirão as suas obras e também os
criadores. A beleza de tudo o que criam pode ser o motivo primeiro da sua
destruição. Na última mesa, naquela que receberá os três últimos antagonistas,
está decidido quem transportará aos ombros a glória derradeira. Sem
sobressaltos, através da forma costumada, dois dos competidores abdicarão das
palavras e ajoelhar-se-ão perante o colega vencedor. A sua história ficará
gravada a letras douradas na pedra mais valiosa da mãe-montanha onde se
arquivará. O vencedor não mais será esquecido, as suas personagens e o herói da
epopeia serão eternizados. As palavras do poema serão acrescentadas às palavras
da primeira de todas as histórias ajudando-a a crescer, ajudando-a a viver para
sempre no coração de todos os leitores, nos seus filhos, nos seus netos, nos
seus bisnetos e nas dez seguintes gerações. Será mencionado pelas infinitas
holoesferas do universo. A epopeia será traduzida, será reinventada, será
ensaiada e muitos tentarão decifrar os mistérios escondidos em todas as suas
dimensões. O escritor passará a ser tão conhecido como o nome do herói por ele
glorificado. Viajará como ninguém, será recebido por todos como um verdadeiro
rei. Hinos e sinfonias lhe serão dedicados e passará a fazer parte de muitas
outras histórias.
Mas as paredes não abrandam o seu silencioso
movimento. O salão ganha pequenez enquanto as palavras se acrescentam às que já
nasceram sem que os jogadores percebam o perigo. Os leitores, esses, continuam
absorvidos, encantados com os enredos que nascem nesta mesa e não abdicam desse
prazer. Se nada se alterar nas próximas duas décadas as oito obras
desaparecerão para todo o sempre juntamente com os seus oito escritores.
Hannibas voa como floco de neve no coração de
Sheridan.
Aqui não existe guerra, só amor. A marca azul que
protege os dois amantes e cristalizou o tempo está em perigo, como as palavras
que contam esta história.
Este amor está em perigo, o império está em perigo e
o futuro rei-serpente pode nem ter acontecido se as paredes que se movem no
grande salão não forem paradas.
Este é um momento de incertezas. A própria
existência desta história e de todos os escritores que comigo contam as
histórias podem muito bem nunca ter acontecido.
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